sábado, 16 de maio de 2009

A militarização da periferia.





Fontes do Exército confirmaram que as técnicas empregadas na ocupação da favela Morro da Providência, são as mesmas que as tropas brasileiras utilizam na missão de paz das Nações Unidas no Haití. Este reconhecimento das forças armadas do Brasil explica, em grande medida, o interesse que tem o governo de Lula da Silva em que as tropas do seu país se mantenham na ilha caribenha: trata-se de pôr em prática as estratégias de contenção nos bairros pobres de Porto Príncipe (capital do Haití), que foram projetadas para serem a m pliadas nas favelas do Rio de Janeiro, São Paulo e outras grandes cidades. Mas a notícia publicada pelo diário Estado de São Paulo vai mais longe ao desnudar a forma de operar dos militares. O general que comanda a ocupação da favela Morro da Providência por 200 soldados, William Soares, comandou a 9ª brigada de Infantaria Motorizada no Haití. Os soldados instalaram metralhadoras na "única praça da comunidade, transformada em base militar", que foram retiradas para facilitar o diálogo com a população. Na reunião com a Associação de Moradores, o general Soares "prometeu obras, festa de Natal com distribuição de presentes para as crianças, colônia de férias, projeção de filmes, atenção médica e sanitária". O general Soares cumpriu todas essas promesas para "aplacar a revolta dos líderes comunitários contra o projeto social previsto para a favela". Segundo informou o diário, "em contrapartida o Exército está recolhendo informações sobre a favela e seus habitantes. Os militares filmaram e fotografaram a reunião e todo o movimento das tropas".Os pobres urbanos como ameaça O urbanista norte-americano Mike Davis analisa as periferias urbanas desde o seu compromisso com o câmbio social. Uma única frase sintetiza a sua análise: "Os subúrbios das cidades do terceiro mundo são o novo cenário geopolítico decisivo". Assegura que os estrategistas do Pentágono estão dando muita importância ao urbanismo e à arquitetura, já que essas periferias são "um dos grandes desafios que deparará o futuro às tecnologias bélicas e aos projetos imperiais". Com efeito, um estudo das Nações Unidas estima que um bilhão de pessoas vivem nos bairros periféricos das cidades do terceiro mundo e que os pobres das grandes cidades do mundo ultrapassam os dois bilhões, um terço da humanidade.





Essas cifras se duplicarão nos próximos 15 a 20 anos, já que o crescimento da população mundial se produzirá integralmente nas cidades e 95% se registrará nos subúrbios das cidades do sul. A situação é mais grave ainda do que mostram os números: a urbanização, como assinala Davis, tem se desconectado e se tornou independente da industrialização e ainda do crescimento econômico, o que implica em uma "desconecção estrutural e permanente de muitos habitantes da cidade em relação à economia formal". Por outro lado, observa que "na última década os pobres—e me refiro n ã o apenas aos dos bairros clássicos que já mostravam altos níveis de organização, mas também aos novos pobres das periferias—têm se organizado em grande escala, tanto em uma cidade iraquiana como em Ciudad Sadr ou em Buenos Aires". Na América Latina, os principais desafios ao domínio das elites têm surgido do coração dos bairros pobres: desde o Caracazo de 1989 até a comunidade de Oaxaca em 2006. Prova disso são as revoltas populares de Assunção em março de 1999, Quito em fevereiro de 1997 e janeiro de 2000, Lima e Cochabamba em abril de 2000, Buenos Aires em dezembro de 2001, Arequipa em junho de 2002, Caracas em abril de 2002, La Paz em fevereiro de 2003 e El Alto em outubro de 2003, para mencionar apenas os casos mais relevantes. Mais ainda: as periferias urbanas têm-se convertido em espaços desde aqueles em que os grupos subalternos lançaram os mais formidáveis desafios ao sistema, até converter-se em espécies de contra-poderes populares. Davis tem razão: o controle dos pobres urbanos é o objetivo mais importante traçado tanto pelos governos como pelos organismos financeiros globais e as forças armadas dos países mais importantes. Muitas grandes cidades latino-americanas parecem, por momentos, à beira da explosão social e várias delas vêm se explodindo nas duas últimas décadas pelos motivos mais diversos. O temos dos poderosos parece apontar a uma dupla direção: prorrogar ou impedir a explosão ou a insurreição e, por outro lado, evitar que se consolodem esses "buracos negros" fora do controle estatal onde surgem os principais desafios das elites.

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